O CRISTO E NÓS: QUESTÃO PESSOAL

JULHO/2015 – Joel Fernandes é Médium e Filósofo

     Se bem nos tempos modernos seja sobejamente verdadeiro Jesus ser um personagem citado apenas culturalmente – mesmo acreditando que o termo mais correto seria dizer “falado” –, mas sem passar disso, “citado culturalmente”, ou seja, sem quaisquer outras conotações morais para a maioria dos viventes ocidentais, o Messias, seguindo  os mandamentos divinos, foi o exemplar humano quem melhor os exemplificou e por isso, se a sua existência já nos incomodava, então também os seus exemplos, além de nos intrigar e instigar, ainda nos incomodam, igualmente.

     Para começar foi homem como nós, apenas e tão-somente isso, sem, biológica e humanamente falando, outra qualquer natureza, pois, afinal, a gravidez de Maria, sua mãe, foi vista e acompanhada pelos vizinhos e parentes e, caso toda gestação haja transcorrido bem, então estamos lhe dando o crédito dos nove meses. Mas, seja dito, que homem!… Eis precisamente o que nos embaraça, porquanto, não passando dum homem – na verdade tratava-se de não mais do que um mísero mortal a transitar na superfície planetária –, então o quê, pensamos friamente, teve de tão especial assim que chegou a cindir a contagem do tempo histórico nuns “antes” e “depois”? Vê-se tal destaque histórico-antropológico nada tendo com o genético, uma vez que o Mestre, em tenra idade, ensinou os doutores judaicos do sinédrio e revelou-lhes seus desconhecimentos, principalmente o do amor incondicionado. Sim, o amor, na medida em que nunca, antes dele, pensador algum, historiador qualquer, sacerdote que fosse, ou filósofo, chegaram a falar ou escrever sobre tal conceito, sequer enunciá-lo, tamanho foi o ineditismo daquele sentimento incomum. Quanto a nós, adiantamos ainda mais a desilusão de não sabermos ainda não só do que se trata, o amor, mesmo considerado em si mesmo, bem como do que o amor trata, do seu objeto; por isso somos, reiteradamente, ignorantes inteiros, mas tal, não obstante, deve nos impedir de pensá-lo, falá-lo, e inteligenciá-lo, caso contrário continuaremos perdidos na densa e negra noite escura da falta de instrução moral superior.

     Prometido por anúncios proféticos constantes do Antigo Testamento, ou “o livro das promessas divinas”, o inigualável legislador amoroso chegou humilde, manso, e em situação quiçá desumana, nascendo entre os irracionais, pois, podemos pensar, o que poderia aguardar dos seus iguais senão insultos, ou, no extremo, violências intoleráveis?

     Falar de Jesus é falar de nós, seus irmãos e público, havendo vindo a nos ensinar-revelar a lei do amor que tudo sofre, que não se irrita, que nunca trai, que se renova sempre, que não se ensoberbece, que jamais se amedronta, e que perdoa indefinidamente.

     Bem o entendeu, apesar de pouco tardiamente, o prometido Paulo de Tarso, seu perseguidor temerário, mas convertido, como multidões o fariam doravante, num “homem do caminho”, nome pelo qual eram conhecidos os cristãos iniciáticos.

    Jesus: bom, justo, pedagógico, companheiro, filho amantíssimo, quem poderia crer houvesse sua boca proferido diálogos – breves que tenham sido – insolentes, ofensivos, politicamente perigosos, como se repentinamente se houvesse transformado num revolucionário? O mau exemplo de Judas não encontrou ressonância no Mestre, e Pedro ouviu-lhe a admoestação ao decepar a orelha do capitão do templo, Malcus: “embainha a tua espada! Acaso não haverei de beber o cálice que o Pai me deu?”.

     Era o homem símbolo da paz, inda estando só, pois, se sua família não o entendia, idem seus seguidores, considerando seus dizeres estranhos, tampouco o colegiado dos doze e nem, muito menos, os romanos. Jesus parecia falar para gentes doutros mundos, numa linguagem tornada oposta aos costumes que, paradoxalmente, não era a de todos, mesmo não sendo louco: a linguagem do amor.

    Tornou-se amado por muito amar, tornou-se seguido por seguir a Deus, e tornou-se cada vez mais humano por não se autoproclamar, senão, demasiadamente humano. Jesus, o “homem de Nazaré”, tornou-se também invulgar por haver sofrido o mais torpe processo judicial da História ao transgredirem todas as justificativas! De quê o acusaram os hipócritas, invejosos, e perversos?

     Não sem motivo tornou-se conhecido como “o cordeiro de Deus” por perdoar a todos em seus momentos derradeiros. Jesus e nós, ou melhor, nós e Jesus, transformou-se numa questão completamente pessoal: que homem foi ele? 

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