FEVEREIRO/2.014 | Percy Corrêa Vieira é Geólogo
O Espiritismo, podemos afirmar, “é a doutrina da síntese”, pois, com sabedoria, sempre soube amalgamar as tese e antítese. O caso da criação e da evolução do nosso planeta é um excelente retrato disso, conforme mostramos abaixo.
O livro “Genesis”, da Bíblia, afirma, por um lado (tese), que o nosso mundo foi constituído pelo Criador em seis dias, conforme a sequência: criou o planeta e deu-lhe luz e sombra (dia e noite); em seguida criou os continentes e os mares; os vegetais; o firmamento com estrelas; os animais marinhos, terrestres, e aéreos; e, em seu final, o homem, este o único ser criado “à Sua semelhança”.
Mas ciências astronômicas afirmam, pelo lado oposto (antítese), que o nosso sistema solar foi formado há 4,6 bilhões de anos a partir de uma nebulosa, sendo essa a idade da Terra quando o universo já contava uma existência entre 7 a 9 bilhões de anos. De modo que a evolução do nosso planeta foi se dando paulatinamente: resfriou-se, estabeleceu a sua estrutura interna central com as porções mais densas e, após, diferenciou-se com a crosta rochosa na superfície.
A Biologia afirma que há cerca de 3,8 bilhões de anos surgiram os primeiros compostos orgânicos; há 2,5 bilhões de anos os primeiros seres vivos vegetais (bactérias e algas unicelulares); depois os animais unicelulares (protozoários), os vegetais pluricelulares; e os animais metazoários (com múltiplas células); na sequência os vegetais superiores conquistaram o ambiente terrestre, concomitantemente com os animais invertebrados marinhos; os peixes; os anfíbios (que ganharam o ambiente terrestre); os répteis; as aves; os mamíferos; e, finalmente, o homem, tudo como fruto da evolução filogenética de uns para os outros (ideia exposta inicialmente pelo inglês Charles Darwin em seu livro “Origem das espécies”, lançado ao tempo do francês Allan Kardec).
A Antropologia também afirma ser o homem a consequência dos primitivos hominídeos surgidos em torno de 1,8 milhão de anos, enquanto o “homo sapiens sapiens” que nos caracteriza como espécie é bastante recente: entre 200 e 50 mil anos. Curiosamente os cálculos matemáticos indicam-nos: caso a Terra surgisse em 1º de janeiro, então o homem só apareceria nos dez últimos segundos do último dia de dezembro!
Acabamos de ver que a proposta bíblica é incompatível com a geológica e Kardec, em seu livro notável, “A Gênese”, abordou sabiamente o tema nos capítulos VI a XII fazendo uso dos conhecimentos científicos obtidos até a metade do XIX: no capítulo XI falou da gênese espiritual como independente da material e estabeleceu uma “simbiose”, digamos assim, entre as mesmas, a qual foi bem detalhada 100 anos depois pelo Espírito André Luiz/Médium Francisco C. Xavier no livro sapientíssimo “Evolução em dois mundos”; e no XII traçou um paralelo entre as duas gêneses.
O “Genesis”, portanto, falto de dados comprobatórios, não passou dum mito; ele é a verdade colocada de uma forma figurada para ser compreendida pelos homens daqueles tempos e mesmo pelos pósteros, conforme ainda persiste sendo ensinado nos templos conservadores da Tradição. Ele é verdadeiro, no fundo, pela apresentação duma sequência de fatos absolutamente coerentes e compatíveis com a investigação científica, todavia é invalidado quanto aos modos pelos quais aqueles se deram. Por isso a síntese espírita não invalida a tese bíblica nem a antítese científica e chega a uma verdade única e compatível com ambas: a demonstração plena a partir da junção de ambas as partes.
Com os conhecimentos geológicos e paleontológicos auferidos podemos equivaler os seis dias de Moisés aos tempos geológicos maiores: hadeano, arqueano, e proterozóico, constitutivos do éon criptozóico (sem animais fossilizados nas rochas); e paleozoico, mesozoico, e cenozoico, constitutivos do éon fanerozóico (com animais fossilizados nas rochas).
Conclusão: o conhecimento humano corre por três vias: o religioso, o filosófico, e o científico, os quais não são excludentes por tratarem de conhecimentos parciais, e o Espiritismo soube muito bem compatibilizar os mesmos, desfazendo assim os aparentes antagonismos seculares existentes.